sábado, 21 de dezembro de 2013

Catador de latas que foi roubado em Cabo Frio tem boas notícias

     Marinô e a mãe, dona Neide, mostram extrato com os valores depositados (Foto: Tomás Baggio/G1)
O Natal de 2013 vai ser inesquecível para o catador de latinhas Marinô Pascoal de Melo, de 45 anos, morador de Cabo Frio. Há quatro meses vivendo a incerteza de quem perdeu todas as economias, ele agora pode voltar a sorrir. Após todo o dinheiro que tinha guardado em uma mochila no quarto ser furtado pelas próprias sobrinhas, de 13 e 14 anos, acompanhadas de uma amiga de 14 anos e da mãe da amiga, Marinô viu uma grande mobilização se formar em torno de seu sofrimento. O resultado desta rede de solidariedade foi uma surpresa para ele e a mãe, Neide Pascoal de Melo, de 76 anos. Ao conferirem o extrato do banco na sexta-feira (20), eles tiveram a boa notícia: agora Marinô tem quase R$ 43 mil em sua conta no banco.
"Nem sei o que dizer. Quero apenas agradecer a tantas pessoas que me ajudaram", disse ele, ao lado da mãe, ao ver o saldo da conta.
A história do homem simples que juntou
R$ 28 mil em casa e teve o dinheiro furtado comoveu moradores de Cabo Frio e internautas de todo o país. 
Marinô tinha o sonho de comprar um imóvel para alugar e viver com a renda. Ele é deficiente físico, mora com a mãe e economizou quase tudo o que ganhava como catador de latinhas e guardador de carros ao longo de dez anos. O dinheiro ficava em uma mochila guardada no armário do quarto, mas ao procurá-lo para pagar a quitinete de R$ 25 mil que decidiu comprar, Marinô deu conta do sumiço do dinheiro.
A campanha na web tinha o objetivo de devolver toda a quantia e fazer com que ele pudesse adquirir o imóvel desejado. A organizadora da campanha, Fabiana Andrade, chegou a viajar 580 Km de Baependi, em Minas Gerais, até Cabo Frio para conhecer Marinô e a família. O saldo desejado foi preenchido por meio de financiamento coletivo em aproximadamente dois meses. Mas, segundo Fabiana, problemas na documentação de Marinô atrasaram a entrega do dinheiro.
Extrato da conta mostra os depósitos da campanha e
o saldo atual (Foto: Tomás Baggio/G1)
"O financiamento foi feito por meio de um site que transfere automaticamente o dinheiro para a conta indicada. Como eu criei a campanha, tive que fazer um termo de transferência de propriedade para o dinheiro ser depositado na conta do Marinô. Mas para esse termo ter validade, o site precisava das informações de todos os documentos do Marinô, e isso demorou a chegar. Assim que as informações foram repassadas, o site iniciou a operação de transferência, que tem prazo de 15 dias úteis para ser concluída. Fico feliz que ele possa ter recebido o dinheiro antes do Natal", disse ela por telefone.
Doações e promessas não cumpridas
Dois depósitos foram feitos pela campanha: um de R$ 4.999,99 e outro de R$ 22.494,19, que entrou após a confirmação do primeiro. O total desta campanha é de R$ 27.494,58, já descontadas as taxas de operação bancária. Entretanto, além do financiamento coletivo, Marinô também recebeu doações diretas na conta dele, cujo número foi divulgado na imprensa local. De acordo com a mãe de Marinô, as doações diretas na conta chegaram a cerca de R$ 13 mil. Além disso, a venda de parte do material comprado com o dinheiro do furto, como móveis e equipamentos eletrônicos, que foram entregues a Marinô após a descoberta da autoria, também rendeu mais um trocado. O resultado é um saldo de R$ 42.994,18 na poupança dele.
Marinô e dona Neide conferem o saldo da conta no
banco (Foto: Tomás Baggio/G1)
Mas, apesar da felicidade pelo sucesso da campanha, Marinô e dona Neide também ficaram ressentidos com a forma que a história deles foi tratada. Eles reclamam de compromissos não cumpridos, e garantem que um terreno prometido nunca foi realmente doado. "Nos levaram até um terreno no Jardim Esperança (bairro de Cabo Frio) para uma reportagem na televisão e disseram que o terreno era meu. Um homem foi lá, disse que era empresário e que eu era um guerreiro. Ele prometeu me doar o terreno para recomeçar o meu sonho ali mas, depois que a reportagem foi ao ar, ele nunca mais voltou e nem a equipe de reportagem da televisão", conta o cabofriense. "Isso não foi certo", emenda a mãe dele.
Decepção dentro da própria família
Foram muitas surpresas na vida de Marinô nos últimos meses. O furto do dinheiro de dentro da mochila que ficava no armário do quarto deu início a uma série de acontecimentos que envolveram toda a família. Na semana seguinte à descoberta do furto, os investigadores da 126ª DP (Cabo Frio) chegaram até as sobrinhas de Marinô. Em depoimento, elas confessaram o furto e deram detalhes. De acordo com o delegado responsável pelo caso, Luiz Cláudio Cruz, o dinheiro foi furtado aos poucos.
"Esta versão foi confirmada após os depoimentos prestados na delegacia. As duas sobrinhas descobriram que ele tinha o dinheiro e começaram a furtá-lo aos poucos. Elas envolveram uma amiga e, posteriormente, a mãe desta amiga descobriu o que estava acontecendo ao ver as coisas que a filha estava comprando. Só que a mãe incentivou o crime e as meninas continuaram furtando até a vítima descobrir, um mês depois", explicou o delegado.
Segundo ele, o dinheiro foi usado para comprar roupas, produtos domésticos e de informática, além de bancar passeios e jantares. As menores foram autuadas por furto, enquanto a mulher identificada como Marcely, mãe de uma delas, responde por corrupção de menores. Os processos estão em andamento e todos os envolvidos respondem em liberdade.
"Estamos muito decepcionados, é claro. Jamais poderíamos imaginar isso", disse, na época, a irmã de Marinô e mãe das outras duas meninas que participaram do furto, Ednéia Pascoal de Melo.
Arrecadação por financiamento coletivo
O sucesso da campanha foi motivo de comemoração também para os diretores do site em que a campanha foi hospedada. Para eles, o resultado é mais um indício da consolidação deste tipo de financiamento.
"Esta campanha fugiu um pouco do que estamos acostumados a fazer pelo valor expressivo do financiamento. Isso mostra o crescimento e a consolidação desta atividade. Cada vez mais o financiamento coletivo estará presente no dia-a-dia das pessoas", afirma Fabrício Milesi, co-fundador do Vakinha.
Promessa de não repetir o descuido
Humilde, com pouca instrução e dificuldade para lidar com equipamentos eletrônicos, Marinô Pascoal de Melo afirma que juntava o dinheiro no quarto por não saber realizar operações bancárias. Mas o susto pela perda do dinheiro, seguido da surpresa por ver o dobro do valor ser recuperado, foi uma lição para ele.
"O dinheirinho do meu trabalho agora vai para o banco", diz ele, que pretende contar com a ajuda de familiares para fazer a movimentação financeira.
Apesar da quitinete que ele queria antes do dinheiro ser furtado não estar mais disponível, Marinô não desiste do sonho e faz planos. Como tem mais dinheiro agora do que tinha antes, ele cogita comprar um terreno e construir o imóvel aos poucos. Já a mãe dele, que não acreditava que o dinheiro pudesse ser recuperado, agora é só alegria. Para ela, o resultado da campanha solidária "é um milagre".
"Só temos a agradecer de todo o coração às pessoas que nos ajudaram desta forma. Gente que fez isso por nós mesmo sem nos conhecer. Desejo que Jesus possa abençoar a todos. E que tenham um Natal com a mesma felicidade que nós vamos ter", disse dona Neide.


Fonte:G1


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